Em 14 de agosto de 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) – Lei 13.709 veio estabelecer regras gerais à proteção de dados pessoais de cada indivíduo – algo que, até então, carecia de salvaguardas e limites na utilização por terceiros.
Com a LGPD, nasceu também a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que, desde então, ao exercer o seu papel de proteção de dados pessoais, iniciou a confecção de alguns guias com o propósito de orientar indivíduos e organizações a tratar da maneira apropriada os dados pessoais de indivíduos; afinal de contas, a LGPD não se destina em absoluto a regulamentar dados de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos.
E, dentro desse contexto, nasceu o guia intitulado “Como Proteger seus Dados Pessoais”, elaborado em parceria com a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) e abordando o assunto com uma linguagem de fácil acesso a qualquer leitor.
O guia começa exemplificando situações nas quais os dados pessoais de um indivíduo podem ser tratados no dia a dia:
– Ao contratar um empréstimo no banco, dados sobre a sua capacidade de pagamento são tratados;
– Ao interagir em uma rede social, dados pessoais sobre o seu comportamento são processados;
– Ao participar de um programa de fidelidade de uma empresa, dados sobre o seu consumo podem ser coletados;
– Para um tratamento de saúde em um hospital são processados dados pessoais, incluindo dados de cadastro e de saúde.
O guia enfatiza, então, a importância da proteção de dados tanto para o cidadão como para a economia e para a sociedade, salientando que a LGPD concretizou direitos previstos da Constituição Federal de 1988, complementando a proteção conferida pelo Código de Defesa do Consumidor e pelo Marco Civil da Internet. Ela também estabeleceu regime diferenciado para as empresas de pequeno porte, como as microempresas e as startups.
Ao abordar os riscos para o consumidor quando há um tratamento ilícito de dados pessoais, o guia enumera alguns que a grande maioria possivelmente jamais teria ideia, como:
1. Monitoramento de seu comportamento e restrição a liberdades fundamentais;
2. Discriminação;
3. Prejuízos econômicos;
4. Restrição de acesso a bens e serviços;
5. Violação da intimidade;
6. Fraudes que afetam a sua identidade;
Seguindo com o seu propósito educacional, o guia passa a explicar o que é dado pessoal, deixando claro que a LGPD o define como qualquer “informação relacionada à pessoa
natural identificada ou identificável”. Na prática, isso quer dizer que são informações pessoais que podem ser associadas a uma pessoa, seja para identificá-la diretamente, seja para associar esses dados a um contexto que permita a sua identificação – por exemplo, utilizando um endereço de e-mail, um número de telefone celular ou uma postagem na internet – são consideradas dados pessoais.
Por conseguinte, o guia passa a listar os dados pessoais mais comuns de um titular, ou seja, a pessoa natural a quem se referem os dados tratados, embora essa lista não seja em absoluto exaustiva:
1. Nome e sobrenome;
2. Endereço residencial;
3. Endereço de e-mail (se ele tiver elementos que ajudem a identificar o dono, como nome e sobrenome);
4. Gênero;
5. Data de nascimento;
6. Número de documentos cadastrais, como RG, CPF e Carteira de Trabalho;
7. Dados de geolocalização de um telefone celular;
8. Número de telefone pessoal.
A seguir, o guia esclarece quem são os agentes de tratamento de dados pessoais:
Além desses agentes de tratamento de dados pessoais, a LGPD também estabelece que as empresas e órgãos públicos indiquem um encarregado de dados para facilitar a comunicação entre os agentes de tratamento, os titulares de dados e a ANPD.
E o que seria tratamento de dados pessoais? Na verdade, é toda operação realizada com eles, como produção, recepção, classificação, utilização, acesso, reprodução, transmissão, distribuição, processamento, arquivamento, armazenamento, eliminação, avaliação ou controle da informação, modificação, comunicação, transferência, difusão ou extração. Além disso, a LGPD limita em 10 (dez) as hipóteses em que os dados pessoais podem ser tratados por um terceiro, indivíduo ou pessoa jurídica do setor público ou do setor privado:
1. Quando há o consentimento do titular dos dados pessoais;
2. Quando o controlador precisa tratar esses dados para cumprir com uma obrigação legal ou regulatória;
3. Quando a administração pública executa políticas públicas ou no desempenho de suas funções institucionais;
4. Para a realização de estudos por órgão de pesquisa;
5. Para a execução de um contrato do qual seja parte o titular, a pedido do titular dos dados;
6. Para o exercício de direitos em um processo judicial, administrativo ou arbitral;
7. Para a proteção da vida e da segurança física do titular;
8. Para a proteção da saúde em procedimento realizado por profissionais de saúde, serviços de saúde ou autoridade sanitária;
9. Quando necessário para atender aos interesses legítimos do controlador ou de terceiro, exceto no caso de prevalecerem direitos e liberdades fundamentais do titular que exijam a proteção dos dados pessoais; e
10. Para a proteção do crédito.
Seguindo sua missão de educar o leitor, o guia passa a listar os princípios que orientam os tratamentos de dados e que serão levados em consideração pela ANPD ao analisar qualquer potencial violação à LGPD. Eis os princípios:
A partir de então, o guia passa a encarar situações reais, iniciando por uma situação hipotética de uma compra na qual a loja precisa dos dados pessoais para entregar um produto comprado pela pessoa, especialmente nome, endereço e telefone. Além desses dados, na hipótese de ser necessária a emissão de nota fiscal, é preciso dispor também do CPF da pessoa.
Se for desejo da pessoa, a loja precisará dar as informações sobre o tratamento de seus dados pessoais para as respectivas finalidades e, se necessário, o compartilhamento de seus dados pessoais pela loja, o direito de saber com quem e o porquê – por exemplo, com uma transportadora. Os dados devem estar armazenados em ambiente seguro e deve ser dado à pessoa o direito de atualizá-los sempre que for necessário.
O guia, então, enfatiza os direitos do titular sobre seus dados pessoais em poder de terceiros:
1. Confirmação
2. Livre Acesso
3. Correção
4. Anonimização
5. Bloqueio
6. Exclusão
7. Portabilidade
8. Eliminação
9. Revogação do Consentimento
10. Solicitação de Informações
11. Revisão
12. Solicitação de Explicações
13. Não Ser Cobrado pelo Exercício de seus Direitos
A seguir, são dadas orientações de como as organizações públicas e privadas devem atuar ao tratar dados pessoais de alguém:
1. Garantindo que todo tratamento de dados pessoais tenha uma base legal;
2. Mantendo registro das operações de tratamento de dados;
3. Elaborando relatório de impacto à proteção de dados pessoais quando o tratamento puder gerar riscos às liberdades civis e aos direitos fundamentais dos titulares;
4. Concebendo sistemas seguros e que protejam os dados desde a sua concepção;
5. Informando ao titular dos dados e à ANPD as violações de segurança dos dados pessoais que possam causar risco ou dano relevantes, com as devidas medidas de contenção ou mitigação;
6. Informando ao titular dos dados caso haja alguma alteração na finalidade para a coleta de dados;
7. Reparando danos causados em razão do tratamento de dados pessoais, em violação à legislação;
8. Confirmando a existência ou providenciando o acesso a dados pessoais, mediante requisição do titular;
9. Divulgando os tipos de dados coletados;
10. Descrevendo a metodologia utilizada para a coleta e compartilhamento de dados;
11. Descrevendo a metodologia utilizada para garantir a segurança das informações;
12. Avaliando de forma permanente as salvaguardas e mecanismos de mitigação de riscos adotados;
13. Indicando o Encarregado de Dados Pessoais e divulgando publicamente as suas informações de contato;
14. Aceitando reclamações, comunicações e prestando esclarecimentos aos titulares de dados;
Além disso, o titular de dados também é encorajado a proteger seus dados pessoais da seguinte forma:
1. Criando backups dos dados armazenados, principalmente em nuvem;
2. Ativando a criptografia nos discos e mídias externas, como pendrives;
3. Criando senhas fortes, que contenham a combinação de caracteres especiais, letras maiúsculas, minúsculas e números, evitando utilizar dados pessoais ou palavras comuns;
4. Habilitando a verificação de senhas em duas etapas sempre que disponível, principalmente em sistemas de armazenamento em nuvem e aplicativos de mensagens;
5. Instalando somente aplicativos de fontes e lojas oficiais;
6. Atualizando sempre o sistema operacional e os aplicativos;
7. Apagando os dados armazenados antes de se desfazer dos equipamentos e das mídias;
8. Desconfiando de links recebidos por aplicativos de mensagens;
9. Limitando a divulgação ou fornecimento de dados pessoais na internet, inclusive para redes sociais ou para empresas, aos casos estritamente necessários;
Finalmente, o guia esclarece que, em se tratando de uma relação de consumo, o titular de dados, em caso de violação de seus direitos, pode registrar uma reclamação no website consumidor.gov.br ou em Procons, Defensorias Públicas, Ministérios Públicos etc., reunindo todas as evidências que comprovem a violação. Caso não se trate de uma relação de consumo, o titular de dados pode efetuar uma reclamação diretamente junto à empresa ou ainda perante à ANPD, especialmente se a empresa não resolver o seu problema. De qualquer forma, não é obrigatório que o titular de dados procure primeiramente a empresa.
O guia, que é livremente disponibilizado a qualquer um, certamente passa a ser uma importante ferramenta para melhor conhecimento dos direitos de cada um sobre os seus dados pessoais.