Direitos Autorais – Caso Nizan Guanaes Vs Stalo Produções Artísticas e Universal Music e a decisão do STJ em favor das produtoras

July 9, 2024

Em decisão proferida em 27/05/2024, a 4ª turma do STJ manteve a decisão do TJ/RJ que reconheceu a validade do contrato de cessão de direitos autorais firmado entre o compositor Nizan Guanaes (cedente) e a Stalo Produções Artísticas (cessionária). O caso envolve os direitos da música “We Are the World of Carnaval”, que foram posteriormente cedidos pela Stalo Produções à Universal Music.

Nizan Guanaes compôs a música “We Are the World of Carnaval” especialmente para a campanha beneficente de arrecadação de fundos das Obras Sociais Irmã Dulce. O nome da canção é uma referência à música “We Are the World” composta por Michael Jackson e Lionel Richie. A “versão brasileira” foi lançada em 28 de novembro de 1988 e se tornou hit constante no carnaval Bahiano, sendo uma das mais tocadas no Carnaval de Salvador e outras micaretas ao redor do Brasil.

Em 1991, Nizan Guanaes firmou um contrato com a Stalo Produções Artísticas, tendo como objeto os direitos da música “We Are the World of Carnaval”. Porém, em 2008, após ter conhecimento de que a Stalo Produções Artísticas havia cedido os direitos sobre a música à Universal Music, ele ingressou com uma ação judicial contra a Stalo Produções alegando que o contrato firmado entre eles seria referente apenas ao direito de edição da música e não à cessão de direitos, sendo, portanto, passível de resilição unilateral conforme disposição do contrato firmado. Ainda, asseverava que a Stalo Produções Artísticas teria deixado de prestar contas e estaria obstaculizando a divulgação da obra, além de ter cedido, sem sua autorização, os direitos à Universal Music, razões pelas quais pretendia a dissolução do vínculo.

Por outro lado, a Stalo Produções Artísticas e a Universal Music, em sede de defesa, apontaram que o contrato inicial se tratava de cessão de direitos autorais, total e permanente, não sendo passível de extinção unilateral. Também afirmaram que cumpriram, de forma adequada, com a prestação de contas e que a divulgação da obra estaria sendo efetuada de forma efetiva.

Sobre os direitos autorais, a proteção ao direito nasce com a criação da obra e sua “fixação” em algum meio, independente de registro. Ou seja, a partir da criação da obra, o autor adquire o direito de paternidade e uso exclusivo. Esses direitos são dotados de natureza híbrida: os direitos morais, relacionados à personalidade do autor, à elaboração e à divulgação da obra, sendo direitos inalienáveis e irrenunciáveis; e os direitos patrimoniais, que consistem na exploração econômica das obras e podem ser cedidos ou transferidos para terceiros, pessoa física ou jurídica.

No que diz respeito à vigência dos direitos, os morais possuem vigência eterna, devendo o autor sempre ser creditado em menções à obra, independente do tempo decorrido desde a criação. Já a proteção dos direitos patrimoniais perdurará por 70 anos, contados de 1º de janeiro do ano subsequente ao falecimento do autor da obra, independentemente de ela ter sido cedida ou não.

Importante notar que a Lei de Direitos Autorais prevê a sucessão dos direitos patrimoniais aos herdeiros do autor quando este falece sem que tenha cedido os direitos à terceiros. De todo modo, tendo cedido os direitos ou quando são herdados, a validade tem o mesmo período de 70 anos apontado. Por outro lado, na hipótese de um autor que não possui herdeiros e não cedeu os direitos, a obra cai em domínio público imediatamente na data de seu falecimento.

No caso em comento, a controvérsia da ação gira em torno da natureza do contrato celebrado entre as partes e dos direitos e obrigações dele decorrentes, bem como da conduta das partes na execução do que fora acordado.

Em sua decisão, o relator do TJ que analisou o caso destacou que o contrato apresentado nos autos estava denominado como “Contrato de Edição e Cessão de Direitos Autorais” e que, nas cláusulas do referido documento, estavam previstas; i) a cessão e transferência, “em plena propriedade”, dos direitos patrimoniais do autor; ii) a sub-rogação à cessionária em todos os direitos e privilégios do cedente; e iii) que a cessão foi feita a título oneroso e fixou remuneração proporcional aos rendimentos auferidos com a obra. Portanto, o contrato em discussão produziria efeitos próprios da cessão de direitos, não apenas pelo exposto em seu título, mas também pelo teor de suas cláusulas.

Nesse sentido, e não tendo a parte autora alegado qualquer vício na celebração do negócio que pudesse causar sua anulabilidade, bem como não ter sido identificada infração à norma legal de qualquer natureza, foi considerada descabida a pretensão do autor à resilição unilateral. Igualmente, foi afastada a resolução por inadimplemento, uma vez que este não foi comprovado.

O caso em apreço traz à tona a importância da elaboração de contratos claros e objetivos, que devem passar por uma análise minuciosa quanto a eventuais riscos e ambiguidades. Dessa forma, é possível delimitar os direitos e obrigações das partes em relação à obra, preservando o real interesse e os direitos dos envolvidos, com intuito de evitar futuros questionamentos quanto às disposições acordadas.

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Em decisão proferida em 27/05/2024, a 4ª turma do STJ manteve a decisão do TJ/RJ que reconheceu a validade do contrato de cessão de direitos autorais firmado entre o compositor Nizan Guanaes (cedente) e a Stalo Produções Artísticas (cessionária). O caso envolve os direitos da música “We Are the World of Carnaval”, que foram posteriormente cedidos pela Stalo Produções à Universal Music.

Nizan Guanaes compôs a música “We Are the World of Carnaval” especialmente para a campanha beneficente de arrecadação de fundos das Obras Sociais Irmã Dulce. O nome da canção é uma referência à música “We Are the World” composta por Michael Jackson e Lionel Richie. A “versão brasileira” foi lançada em 28 de novembro de 1988 e se tornou hit constante no carnaval Bahiano, sendo uma das mais tocadas no Carnaval de Salvador e outras micaretas ao redor do Brasil.

Em 1991, Nizan Guanaes firmou um contrato com a Stalo Produções Artísticas, tendo como objeto os direitos da música “We Are the World of Carnaval”. Porém, em 2008, após ter conhecimento de que a Stalo Produções Artísticas havia cedido os direitos sobre a música à Universal Music, ele ingressou com uma ação judicial contra a Stalo Produções alegando que o contrato firmado entre eles seria referente apenas ao direito de edição da música e não à cessão de direitos, sendo, portanto, passível de resilição unilateral conforme disposição do contrato firmado. Ainda, asseverava que a Stalo Produções Artísticas teria deixado de prestar contas e estaria obstaculizando a divulgação da obra, além de ter cedido, sem sua autorização, os direitos à Universal Music, razões pelas quais pretendia a dissolução do vínculo.

Por outro lado, a Stalo Produções Artísticas e a Universal Music, em sede de defesa, apontaram que o contrato inicial se tratava de cessão de direitos autorais, total e permanente, não sendo passível de extinção unilateral. Também afirmaram que cumpriram, de forma adequada, com a prestação de contas e que a divulgação da obra estaria sendo efetuada de forma efetiva.

Sobre os direitos autorais, a proteção ao direito nasce com a criação da obra e sua “fixação” em algum meio, independente de registro. Ou seja, a partir da criação da obra, o autor adquire o direito de paternidade e uso exclusivo. Esses direitos são dotados de natureza híbrida: os direitos morais, relacionados à personalidade do autor, à elaboração e à divulgação da obra, sendo direitos inalienáveis e irrenunciáveis; e os direitos patrimoniais, que consistem na exploração econômica das obras e podem ser cedidos ou transferidos para terceiros, pessoa física ou jurídica.

No que diz respeito à vigência dos direitos, os morais possuem vigência eterna, devendo o autor sempre ser creditado em menções à obra, independente do tempo decorrido desde a criação. Já a proteção dos direitos patrimoniais perdurará por 70 anos, contados de 1º de janeiro do ano subsequente ao falecimento do autor da obra, independentemente de ela ter sido cedida ou não.

Importante notar que a Lei de Direitos Autorais prevê a sucessão dos direitos patrimoniais aos herdeiros do autor quando este falece sem que tenha cedido os direitos à terceiros. De todo modo, tendo cedido os direitos ou quando são herdados, a validade tem o mesmo período de 70 anos apontado. Por outro lado, na hipótese de um autor que não possui herdeiros e não cedeu os direitos, a obra cai em domínio público imediatamente na data de seu falecimento.

No caso em comento, a controvérsia da ação gira em torno da natureza do contrato celebrado entre as partes e dos direitos e obrigações dele decorrentes, bem como da conduta das partes na execução do que fora acordado.

Em sua decisão, o relator do TJ que analisou o caso destacou que o contrato apresentado nos autos estava denominado como “Contrato de Edição e Cessão de Direitos Autorais” e que, nas cláusulas do referido documento, estavam previstas; i) a cessão e transferência, “em plena propriedade”, dos direitos patrimoniais do autor; ii) a sub-rogação à cessionária em todos os direitos e privilégios do cedente; e iii) que a cessão foi feita a título oneroso e fixou remuneração proporcional aos rendimentos auferidos com a obra. Portanto, o contrato em discussão produziria efeitos próprios da cessão de direitos, não apenas pelo exposto em seu título, mas também pelo teor de suas cláusulas.

Nesse sentido, e não tendo a parte autora alegado qualquer vício na celebração do negócio que pudesse causar sua anulabilidade, bem como não ter sido identificada infração à norma legal de qualquer natureza, foi considerada descabida a pretensão do autor à resilição unilateral. Igualmente, foi afastada a resolução por inadimplemento, uma vez que este não foi comprovado.

O caso em apreço traz à tona a importância da elaboração de contratos claros e objetivos, que devem passar por uma análise minuciosa quanto a eventuais riscos e ambiguidades. Dessa forma, é possível delimitar os direitos e obrigações das partes em relação à obra, preservando o real interesse e os direitos dos envolvidos, com intuito de evitar futuros questionamentos quanto às disposições acordadas.

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