De acordo com a Constituição Federal de 1988, são poderes harmônicos entre si o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Em passado remoto e também no recente, o Brasil assistiu à utilização da ferramenta do impeachment para tirar do poder quatro Presidentes da República: 1. Café Filho, conforme o impeachment confirmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro de 1955, 2. Carlos Luz, que substituiu Café Filho e teve o impeachment também confirmado pelo STF no mesmo novembro de 1955, 3. Fernando Collor de Mello, o qual se valeu de uma carta de renúncia ao seu cargo, em 30 de dezembro de 1992, para fugir do impeachment que já era articulado contra si no Congresso Nacional, e 4. Dilma Rousseff, que teve o impeachment determinado pelo Congresso Nacional em 31 de agosto de 2016.
Mas o que seria o impeachment? Ele é um processo instaurado com base em denúncia de crime de responsabilidade contra alta autoridade do Poder Executivo (p.ex., Presidente da República, Governadores, Prefeitos) ou do Judiciário (p.ex., Ministros do STF), cuja decisão é da alçada do Poder Legislativo.
Em 10 de abril de 1950, foi sancionada no Brasil a Lei 1.079, que define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento de autoridades que os cometam. Mas que autoridades são essas? Na verdade, estamos falando do Presidente da República, dos Ministros de Estado, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Procurador-Geral da República.
1.1. PRESIDENTE DA REPÚBLICA
São considerados crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentarem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
1. a existência da União.
2. o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e dos poderes constitucionais dos Estados.
3. o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais.
4. a segurança interna do país.
5. a probidade na administração.
6. a lei orçamentária.
7. a guarda e o legal emprego dos dinheiros públicos.
8. o cumprimento das decisões judiciárias.
Embora as ações acima sejam as principais, o Presidente da República pode ser ainda responsabilizado nas seguintes situações:
CRIMES CONTRA A EXISTÊNCIA DA UNIÃO
1. entreter, direta ou indiretamente, inteligência com governo estrangeiro, provocando-o a fazer guerra ou cometer hostilidade contra a República, prometer-lhe assistência ou favor, ou dar-lhe qualquer auxílio nos preparativos ou planos de guerra contra a República.
2. tentar, diretamente e por fatos, submeter a União ou algum dos Estados ou Territórios a domínio estrangeiro, ou dela separar qualquer Estado ou porção do território nacional.
3. cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra ou comprometendo-lhe a neutralidade.
4. revelar negócios políticos ou militares que devam ser mantidos secretos a bem da defesa da segurança externa ou dos interesses da Nação.
5. auxiliar, por qualquer modo, nação inimiga a fazer a guerra ou a cometer hostilidade contra a República.
6. celebrar tratados, convenções ou ajustes que comprometam a dignidade da Nação.
7. violar a imunidade dos embaixadores ou Ministros estrangeiros acreditados no país.
8. declarar a guerra, salvo os casos de invasão ou agressão estrangeira, ou fazer a paz, sem autorização do Congresso Nacional.
9. não empregar contra o inimigo os meios de defesa de que poderia dispor.
10. permitir o Presidente da República, durante as sessões legislativas e sem autorização do Congresso Nacional, que forças estrangeiras transitem pelo território do país, ou, por motivo de guerra, nele permaneçam temporariamente.
11. violar tratados legitimamente feitos com nações estrangeiras.
CRIMES CONTRA O LIVRE EXERCÍCIO DOS PODERES CONSTITUCIONAIS
1. tentar dissolver o Congresso Nacional, impedir a reunião ou tentar impedir por qualquer modo o funcionamento de qualquer de suas Câmaras.
2. usar de violência ou ameaça contra algum representante da Nação para afastá-lo da Câmara a que pertença ou para coagi-lo no modo de exercer o seu mandato bem como conseguir ou tentar conseguir o mesmo objetivo mediante suborno ou outras formas de corrupção.
3. violar as imunidades asseguradas aos membros do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas dos Estados, da Câmara dos Vereadores do Distrito Federal e das Câmaras Municipais.
4. permitir que força estrangeira transite pelo território do país ou nele permaneça quando a isso se oponha o Congresso Nacional.
5. opor-se diretamente e por fatos ao livre exercício do Poder Judiciário, ou obstar, por meios violentos, ao efeito dos seus atos, mandados ou sentenças.
6. usar de violência ou ameaça, para constranger juiz, ou jurado, a proferir ou deixar de proferir despacho, sentença ou voto, ou a fazer ou deixar de fazer ato do seu ofício.
7. praticar contra os poderes estaduais ou municipais ato definido como crime neste artigo.
8. intervir em negócios peculiares aos Estados ou aos Municípios com desobediência às normas constitucionais.
CRIMES CONTRA O EXERCÍCIO DOS DIREITOS POLÍTICOS, INDIVIDUAIS E SOCIAIS
1. impedir por violência, ameaça ou corrupção, o livre exercício do voto.
2. obstar ao livre exercício das funções dos mesários eleitorais.
3. violar o escrutínio de seção eleitoral ou inquinar de nulidade o seu resultado pela subtração, desvio ou inutilização do respectivo material.
4. utilizar o poder federal para impedir a livre execução da lei eleitoral.
5. servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua,
6. subverter ou tentar subverter por meios violentos a ordem política e social.
7. incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina.
8. provocar animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contra as instituições civis.
9. violar patentemente qualquer direito ou garantia individual constante do art. 141 e bem assim os direitos sociais assegurados no artigo 157 da Constituição.
10. tomar ou autorizar durante o estado de sítio, medidas de repressão que excedam os limites estabelecidos na Constituição.
CRIMES CONTRA A SEGURANÇA INTERNA DO PAÍS
1. tentar mudar por violência a forma de governo da República.
2. tentar mudar por violência a Constituição Federal ou de algum dos Estados, ou lei da União, de Estado ou Município.
3. decretar o estado de sítio, estando reunido o Congresso Nacional, ou no recesso deste, não havendo comoção interna grave nem fatos que evidenciem estar a mesma a irromper ou não ocorrendo guerra externa.
4. praticar ou concorrer para que se perpetre qualquer dos crimes contra a segurança interna, definidos na legislação penal.
5. não dar as providências de sua competência para impedir ou frustrar a execução desses crimes.
6. ausentar-se do país sem autorização do Congresso Nacional.
7. permitir, de forma expressa ou tácita, a infração de lei federal de ordem pública.
8. deixar de tomar, nos prazos fixados, as providências determinadas por lei ou tratado federal e necessário a sua execução e cumprimento.
CRIMES CONTRA A PROBIDADE NA ADMINISTRAÇÃO
1. omitir ou retardar dolosamente a publicação das leis e resoluções do Poder Legislativo ou dos atos do Poder Executivo.
2. não prestar ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa, as contas relativas ao exercício anterior.
3. não tornar efetiva a responsabilidade dos seus subordinados, quando manifesta em delitos funcionais ou na prática de atos contrários à Constituição.
4. expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição.
5. infringir no provimento dos cargos públicos, as normas legais.
6. usar de violência ou ameaça contra funcionário público para coagi-lo a proceder ilegalmente, bem como utilizar-se de suborno ou de qualquer outra forma de corrupção para o mesmo fim.
7. proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo.
CRIMES CONTRA A LEI ORÇAMENTÁRIA
1. não apresentar ao Congresso Nacional a proposta do orçamento da República dentro dos primeiros dois meses de cada sessão legislativa.
2. exceder ou transportar, sem autorização legal, as verbas do orçamento.
3. realizar o estorno de verbas.
4. infringir , patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária.
5. deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado Federal.
6. ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal.
7. deixar de promover ou de ordenar na forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei.
8. eixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro.
9. ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente.
10. captar recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido.
11. ordenar ou autorizar a destinação de recursos provenientes da emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a autorizou.
12. realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei.
CRIMES CONTRA A GUARDA LEGAL E EMPREGO DOS DINHEIROS PÚBLICOS
1. ordenar despesas não autorizadas por lei ou sem observância das prescrições legais relativas às mesmas.
2. Abrir crédito sem fundamento em lei ou sem as formalidades legais.
3. Contrair empréstimo, emitir moeda corrente ou apólices, ou efetuar operação de crédito sem autorização legal.
4. alienar imóveis nacionais ou empenhar rendas públicas sem autorização legal.
5. negligenciar a arrecadação das rendas impostos e taxas, bem como a conservação do patrimônio nacional.
CRIMES CONTRA O CUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIÁRIAS
1. impedir, por qualquer meio, o efeito dos atos, mandados ou decisões do Poder Judiciário.
2. recusar o cumprimento das decisões do Poder Judiciário no que depender do exercício das funções do Poder Executivo.
3. deixar de atender a requisição de intervenção federal do Supremo Tribunal Federal ou do Tribunal Superior Eleitoral.
4. Impedir ou frustrar pagamento determinado por sentença judiciária.
1.2. MINISTROS DE ESTADO
São crimes de responsabilidade dos Ministros de Estado:
1. os atos definidos nesta lei, quando por eles praticados ou ordenados.
2. os atos previstos nesta lei que os Ministros assinarem com o Presidente da República ou por ordem deste praticarem.
3. A falta de comparecimento sem justificação, perante a Câmara dos Deputados ou o Senado Federal, ou qualquer das suas comissões, quando uma ou outra casa do Congresso os convocar para pessoalmente, prestarem informações acerca de assunto previamente determinado.
4. Não prestarem dentro em trinta dias e sem motivo justo, a qualquer das Câmaras do Congresso Nacional, as informações que ela lhes solicitar por escrito, ou prestarem-nas com falsidade.
1.3. IMPEACHMENT DE PRESIDENTE DA REPÚBLICA E DE MINISTROS DE ESTADO
O processo de impeachment de Presidente da República ou de Ministros de Estado inicia-se por uma denúncia de qualquer cidadão perante a Câmara dos Deputados, sendo certo que a denúncia somente será recebida se o indivíduo estiver ainda no exercício da referida função. A denúncia deve ser assinada com firma reconhecida, devendo serem juntados todos os documentos e o respectivo rol de testemunhas, se houver.
Recebida a denúncia, será a mesma lida na sessão seguinte e despachada a uma comissão especial eleita, da qual participem proporcionalmente representantes de todos os partidos políticos para opinar sobre a mesma.
A referida comissão deve se reunir em 48 horas e emitir um parecer em dez dias. Cinco representantes de cada partido poderão falar durante uma hora sobre o parecer, ressalvado ao relator da Comissão Especial o direito de resposta a cada um deles.
Encerrada a discussão, será a denúncia submetida a votação nominal, podendo ser arquivada ou acatada. Na segunda hipótese, será enviada cópia ao denunciado, que terá o prazo de 20 dias para contestá-la e indicar os meios de prova. Findo o prazo, com ou sem contestação, a comissão procederá a diligências, conforme o caso, e proferirá no prazo de dez dias um parecer sobre a procedência ou a improcedência da denúncia.
Encerrada a discussão do parecer, passa-se à votação nominal, não sendo permitido mais questões de ordem. Se a votação for pela procedência, será decretada a acusação do Presidente da República ou do Ministro de Estado e, caso se trate de crime comum ou de responsabilidade, o processo será enviado ao Supremo Tribunal Federal ou ao Senado Federal.
Recebido no Senado o decreto de acusação com o processo enviado pela Câmara dos Deputados e apresentado o libelo pela comissão acusadora, remeterá o Presidente cópia de tudo ao acusado, que, na mesma ocasião, será notificado para comparecer em dia prefixado perante o Senado. No dia aprazado para o julgamento, presentes o acusado, seus advogados, ou o defensor nomeado à sua revelia, e a comissão acusadora, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, abrindo a sessão, mandará ler o processo preparatório, o libelo e os artigos de defesa. Em seguida, inquirirá as testemunhas, que deverão depor publicamente e fora da presença umas das outras, sendo que qualquer membro da Comissão acusadora ou do Senado, e bem assim o acusado ou seus advogados, poderão requerer que se façam às testemunhas perguntas que julgarem necessárias.
Realizar-se-á a seguir o debate verbal entre a comissão acusadora e o acusado ou os seus advogados pelo prazo que o Presidente fixar e que não poderá exceder duas horas. Findos os debates orais e retiradas as partes, abrir-se-á discussão sobre o objeto da acusação. Encerrada a discussão, o Presidente do STF fará relatório resumido da denúncia e das provas da acusação e da defesa e submeterá à votação nominal dos senadores o julgamento.
1.4. MINISTROS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
São crimes de responsabilidade dos Ministros do STF:
1. alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal.
2. proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa.
3. exercer atividade político-partidária.
4. ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo.
5. proceder de modo incompatível com a honra dignidade e decoro de suas funções.
6. todas as 12 espécies de crimes contra a lei orçamentária acima descritas.
São igualmente alcançados os Presidentes, e respectivos substitutos quando no exercício da Presidência, dos Tribunais Superiores, dos Tribunais de Contas, dos Tribunais Regionais Federais, do Trabalho e Eleitorais, dos Tribunais de Justiça e de Alçada dos Estados e do Distrito Federal, e os Juízes Diretores de Foro ou função equivalente no primeiro grau de jurisdição.
1.5. PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
São crimes de responsabilidade do Procurador-Geral da República:
1. emitir parecer, quando, por lei, seja suspeito na causa.
2. recusar-se a prática de ato que lhe incumba.
3. ser patentemente desidioso no cumprimento de suas atribuições.
4. proceder de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo.
5. todas as 12 espécies de crimes contra a lei orçamentária acima descritas.
1.6. IMPEACHMENT DE MINISTROS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL OU DO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
O processo de impeachment de Ministro do Supremo Tribunal Federal ou do Procurador-Geral da República inicia-se por uma denúncia de qualquer cidadão perante o Senado Federal, sendo certo que a denúncia somente será recebida se o indivíduo estiver ainda no exercício da referida função. A denúncia deve ser assinada com firma reconhecida, devendo serem juntados todos os documentos e o respectivo rol de testemunhas, se houver.
O trâmite segue praticamente o mesmo procedimento descrito acima para o julgamento do Presidente da República ou de Ministros de Estado, ressalvado o fato de que, neste caso, não existe a formação de uma Comissão de acusação.
Entretanto, é importante salientar que tanto o Presidente da Câmara dos Deputados, no caso de Presidente da República ou Ministro de Estado, quanto o Presidente do Senado Federal, no caso de Ministro do STF ou do Procurador-Geral da República, possuem “superpoderes” para receber ou não a denúncia de impeachment e, somente a partir daí, iniciar-se-á o processo de impeachment descrito acima.