Ser preso no Brasil não é para amadores. A lei processual brasileira, especialmente na esfera criminal, cria tantos mecanismos para adiar o trânsito em julgado da decisão judicial (quando não mais cabe recurso de qualquer espécie), que aqueles com recursos para contratar um advogado ou contando um defensor público atuante, consegue procrastinar a decisão final, transitada em julgado. Com isso, em muitos casos, alcança-se a prescrição penal, embora a legislação esteja avançando a passos lentos para tentar tornar imprescritíveis delitos como feminicídio ou estupro.
A dificuldade para prender alguém começa respaldada por alguns direitos fundamentais listados no Art. 5º da Constituição Federal de 1988, especialmente o inciso LVI, com o seguinte texto:
Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
Art. 5º, LVII da Constituição Federal de 1988.
Prender alguém se torna ainda mais complexo com o disposto no Art. 5º, LXI que dispõe o seguinte:
Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
Art. 5º, LXI da Constituição Federal de 1988.
No Brasil, a lei permite a prisão de alguém em algumas circunstâncias, tais como:
Em 2019, entretanto, o deputado Alex Manente, do partido Cidadania de São Paulo, apresentou a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 199/19, com uma solução, no mínimo, peculiar. Em vez de permitir a prisão de alguém após a mera condenação em segunda instância, propôs a extinção do Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Recurso Extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (STF) previstos nos Arts. 102 e 105 da Constituição Federal. Dessa forma, a condenação em segunda instância já transitaria em julgado, não sendo passível de recursos aos tribunais superiores. Assim, não haveria alteração de dispositivos do Art. 5º, que tratam dos direitos fundamentais do cidadão, sendo considerados cláusulas pétreas, não passíveis de alteração quando o propósito for subtrair ou reduzir os direitos ali definidos.
Por outro lado, a PEC ainda permitiria ao réu apresentar ação revisional especial ou extraordinária ao STF e ao STJ, mas sem que tal prerrogativa impedisse que a pena na prisão começasse a ser cumprida.
Mas definitivamente essa não foi a única iniciativa sobre o mesmo assunto e que não logrou êxito para alterar a Constituição Federal. O ex-Ministro e atual senador Sérgio Moro desarquivou o Projeto de Lei do Senado (PLS) 166/18, oriundo de um desmembramento do pacote anticrime apresentado por ele, quando ocupava o cargo de Ministro da Justiça, durante o mandato do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro e de autoria do Senador Lasier Martins do PSD do Rio Grande do Sul.
Ao contrário da PEC 199/19, esse PLS 166/18 sofreu duro ataque de alguns constitucionalistas, pois focou na alteração do Código de Processo Penal, permitindo a prisão desde a condenação em segunda instância. Isso contrariaria os dispositivos constitucionais acima, sendo, portanto, inconstitucional.
Será, com efeito, um tema bastante polêmico que a sociedade verá ser debatido nos próximos meses, em mais uma tentativa de reduzir a impunidade reinante na terra brasilis.