Certamente, os últimos anos foram marcados por turbulências, especialmente para os brasileiros, no que diz respeito ao combate à corrupção. Decisões judiciais controversas, que reacenderam enorme polêmica, reduziram a eficácia da operação “Lava Jato” no Brasil. Os baluartes do combate à corrupção acabaram sendo maculados como vilões, em um país propenso a obscurecer aqueles que ganham o holofote.
No entanto, a notícia mais surpreendente dessa última semana veio da Inglaterra em que o Serious Fraud Office (SFO) foi acusado pela Suprema Corte de Londres de ter cometido uma violação grave. Como resultado, terá que indenizar uma empresa investigada.
Na verdade, segundo a corte, o problema se deu quando o SFO começou a investigar corrupção na empresa Eurasian Natural Resources Corp., com base em informações obtidas de maneira indevida por um advogado sênior da empresa.
Esse advogado pertencia a um escritório de advocacia chamado Dechert, que fora contratado pela empresa para conduzir uma investigação interna sobre um possível suborno. A partir dessas informações obtidas junto a esse advogado, o SFO iniciou a sua investigação, informações sem as quais não seria possível.
De fato, após mais de 10 anos investigando a Eurasian Natural Resources Corp., o SFO abandonou a investigação. Enfim, a corte realizará um julgamento adicional para determinar quanto a Agência deve pagar à Eurasian Natural Resources Corp. pela suposta violação.
Esse é um duro golpe para o SFO, cujas adversidades podem ser colimadas no ano de 2023 quando aplicou a maior penalidade já imposta desde a sua existência. Isso decorreu de um acordo que garantiu uma multa de £ 280 milhões contra a empresa Glencore, uma multinacional anglo-suíça de commodities de mineração, que comercializa metais, produtos agrícolas e energia. A Glencore tem sede internacional em Baar, na Suíça e fundada por Marc Rich, um empresário israelita-belga-espanhol. O motivo da multa foram subornos para obtenção de acesso privilegiado a exploração de petróleo na África, além de outras duas investigações nos EUA e no Brasil.
Esse êxito contrastou com o revés na investigação da Unaoil, na qual o SFO foi acusado por um juiz de cometer uma série de erros. A Unaoil é uma empresa sediada em Mônaco que fornece “soluções industriais para o setor de energia no Oriente Médio, Ásia Central e África”, estando incorporada nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal com um sistema bancário razoavelmente opaco.
O fato é que o SFO focou sua investigação nas interações com um investigador privado chamado David Tinsley, ex-agente da Administração Antidrogas dos EUA, que representava um dos membros da família Ahsani, proprietária e controladora da Unaoil. Esse investigador tentou intermediar um acordo com a Agência, prometendo obter a confissão de culpa de vários réus. Novamente, o SFO sofreu dura perda nos tribunais, pois a justiça entendeu que os réus haviam sido prejudicados pela falta de divulgação, por parte da Agência, de documentos que demonstrassem as interações com David Tinsley.
Por fim, segundo a diretora do SFO Lisa Osofsky, a Agência tenta atualmente superar um grande desafio: recrutar e reter pessoal. A inflação no Reino Unido tem corroído o poder de compra dos agentes públicos, os quais não têm reajuste dos seus vencimentos. Em março de 2023, o SFO contava com apenas 450 agentes públicos, em comparação a 470 no ano anterior, havendo uma taxa de vacância de 8,5%. Isso tem forçado a Agência a recorrer a trabalhadores temporários e a advogados externos contratados para determinadas tarefas.