Quando falamos em correção monetária e juros, é porque estamos lidando com o fantasma da inflação. Sem inflação, não precisaríamos corrigir monetariamente valores e nem aplicar taxas de juros extorsivas como as que ainda são praticadas no Brasil, principalmente quando comparadas a outros países nos quais a inflação possui um histórico de controle a longo prazo. É bem verdade que o Brasil possui distorções inimagináveis em outros países, como os juros praticados pelos operadores de cartões de crédito, que encontram aqui um oásis para impor taxas que seriam consideradas ilícitas em outros lugares.
Mas o que é inflação? Segundo o Banco Central do Brasil (BACEN), inflação é o aumento dos preços de bens e serviços e implica na diminuição do poder de compra da moeda. A inflação é medida por índices de preços e o Brasil possui vários índices de preços, destacando-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), como o mais utilizado no sistema de metas para a inflação.
Ainda segundo o BACEN, as causas para o aumento da inflação podem ser resumidas em (i) pressões de demanda (quando ocorre um aumento na procura de algum bem ou serviço), (ii) pressões de custos (quando ocorre um aumento no custo da fabricação de algum bem ou para a execução de algum serviço), (iii) inércia inflacionária (processo em que a inflação passada se reflete nos preços presentes, por exemplo, na indexação) ou (iv) expectativas de inflação (composta por muitas variáveis, como taxa de desemprego, política monetária, credibilidade etc.).
Iniciado em 1993, o Plano Real foi um processo de estabilização econômica bem sucedido no Brasil após inúmeros fracassos como o Plano Bresser e o Plano Collor. Passamos a ter um controle da inflação que a maioria dos brasileiros vivos à época nunca tinha experimentado em toda a sua vida.
Com respeito aos contratos, o Plano Real trouxe uma consequência significativa. Ela ocorreu na aprovação da Lei 10.192, de 14 de fevereiro de 2001 que, em seu Artigo 20 e no respectivo parágrafo décimo, determinou o seguinte:
“Art. 2o – É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.
§ 1o – É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.”
Desde então, foi vedado aos contratos possuir cláusula que permitisse o seu reajuste, atribuindo um indexador que corrigisse monetariamente o seu valor, com periodicidade inferior a um ano.
Eis que, finalmente, em 28 de junho de 2024, foi sancionada a Lei 14.905, que alterou o Código Civil para trazer novas diretrizes acerca de correção monetária e juros. Basicamente, foram introduzidas as seguintes alterações no referido código:
É importante salientar que a questão dos juros em contratos já era normatizada no arcabouço legal vigente no Brasil muito antes do Plano Real. Isso ocorria mediante o Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933, que dispunha sobre os juros nos contratos, não permitindo a cobrança de juros acima do dobro da taxa legal. Por outro lado, essa nova lei também alterou tal disposição, já que excluiu do alcance do referido decreto as seguintes obrigações:
I – contratadas entre pessoas jurídicas;
II – representadas por títulos de crédito ou valores mobiliários;
III – contraídas perante:
a) instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil;
b) fundos ou clubes de investimento;
c) sociedades de arrendamento mercantil e empresas simples de crédito;
d) organizações da sociedade civil de interesse público de que trata a Lei nº 9.790, de 23 de março de 1999, que se dedicam à concessão de crédito;
IV – realizadas nos mercados financeiro, de capitais ou de valores mobiliários.
Por fim, o legislador estabeleceu uma vacatio legis (intervalo de tempo entre a data da publicação de uma lei e a data em que ela entra efetivamente em vigor) de 60 dias, sendo que somente após esse prazo, esta lei produzirá seus efeitos.