Novas Regras Sobre Correção Monetária e Juros

July 18, 2024

Quando falamos em correção monetária e juros, é porque estamos lidando com o fantasma da inflação. Sem inflação, não precisaríamos corrigir monetariamente valores e nem aplicar taxas de juros extorsivas como as que ainda são praticadas no Brasil, principalmente quando comparadas a outros países nos quais a inflação possui um histórico de controle a longo prazo. É bem verdade que o Brasil possui distorções inimagináveis em outros países, como os juros praticados pelos operadores de cartões de crédito, que encontram aqui um oásis para impor taxas que seriam consideradas ilícitas em outros lugares.

Mas o que é inflação? Segundo o Banco Central do Brasil (BACEN), inflação é o aumento dos preços de bens e serviços e implica na diminuição do poder de compra da moeda. A inflação é medida por índices de preços e o Brasil possui vários índices de preços, destacando-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), como o mais utilizado no sistema de metas para a inflação.

Ainda segundo o BACEN, as causas para o aumento da inflação podem ser resumidas em (i) pressões de demanda (quando ocorre um aumento na procura de algum bem ou serviço), (ii) pressões de custos (quando ocorre um aumento no custo da fabricação de algum bem ou para a execução de algum serviço), (iii) inércia inflacionária (processo em que a inflação passada se reflete nos preços presentes, por exemplo, na indexação) ou (iv) expectativas de inflação (composta por muitas variáveis, como taxa de desemprego, política monetária, credibilidade etc.).

Iniciado em 1993, o Plano Real foi um processo de estabilização econômica bem sucedido no Brasil após inúmeros fracassos como o Plano Bresser e o Plano Collor. Passamos a ter um controle da inflação que a maioria dos brasileiros vivos à época nunca tinha experimentado em toda a sua vida.

Com respeito aos contratos, o Plano Real trouxe uma consequência significativa. Ela ocorreu na aprovação da Lei 10.192, de 14 de fevereiro de 2001 que, em seu Artigo 20 e no respectivo parágrafo décimo, determinou o seguinte:

“Art. 2o – É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.

§ 1o – É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.”

Desde então, foi vedado aos contratos possuir cláusula que permitisse o seu reajuste, atribuindo um indexador que corrigisse monetariamente o seu valor, com periodicidade inferior a um ano.

Eis que, finalmente, em 28 de junho de 2024, foi sancionada a Lei 14.905, que alterou o Código Civil para trazer novas diretrizes acerca de correção monetária e juros. Basicamente, foram introduzidas as seguintes alterações no referido código:

ARTIGO

NOVA DIRETRIZ

Artigo 389

Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado.

Artigo 395

Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários e honorários de advogado.

Artigo 404

As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária, juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Artigo 406

Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal.

§ 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código.

§ 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil.

§ 3º Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência.

Artigo 418

Na hipótese de inexecução do contrato, se esta se der:

I – por parte de quem deu as arras, poderá a outra parte ter o contrato por desfeito, retendo-as;

II – por parte de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito e exigir a sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária, juros e honorários de advogado.

Artigo 591

Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros.

Parágrafo único. Se a taxa de juros não for pactuada, aplica-se a taxa legal prevista no art. 406 deste Código.

Artigo 772

A mora do segurador em pagar o sinistro obriga à atualização monetária da indenização devida, sem prejuízo dos juros moratórios.

Artigo 1.336, § 1º

§ 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito à correção monetária e aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, aos juros estabelecidos no art. 406 deste Código, bem como à multa de até 2% (dois por cento) sobre o débito.

É importante salientar que a questão dos juros em contratos já era normatizada no arcabouço legal vigente no Brasil muito antes do Plano Real. Isso ocorria mediante o Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933, que dispunha sobre os juros nos contratos, não permitindo a cobrança de juros acima do dobro da taxa legal. Por outro lado, essa nova lei também alterou tal disposição, já que excluiu do alcance do referido decreto as seguintes obrigações:

I – contratadas entre pessoas jurídicas;

II – representadas por títulos de crédito ou valores mobiliários;

III – contraídas perante:

a) instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil;

b) fundos ou clubes de investimento;

c) sociedades de arrendamento mercantil e empresas simples de crédito;

d) organizações da sociedade civil de interesse público de que trata a Lei nº 9.790, de 23 de março de 1999, que se dedicam à concessão de crédito;

IV – realizadas nos mercados financeiro, de capitais ou de valores mobiliários.

Por fim, o legislador estabeleceu uma vacatio legis (intervalo de tempo entre a data da publicação de uma lei e a data em que ela entra efetivamente em vigor) de 60 dias, sendo que somente após esse prazo, esta lei produzirá seus efeitos.

No items found.

RECENT POSTS

LINKEDIN FEED

Newsletter

Register your email and receive our updates

Thank you! Your submission has been received!
Oops! Something went wrong while submitting the form.

FOLLOW US ON SOCIAL MEDIA

Newsletter

Register your email and receive our updates-

Thank you! Your submission has been received!
Oops! Something went wrong while submitting the form.

FOLLOW US ON SOCIAL MEDIA

Licks Attorneys' Government Affairs & International Relations Blog

Doing Business in Brazil: Political and economic landscape

Licks Attorneys' COMPLIANCE Blog

Novas Regras Sobre Correção Monetária e Juros

No items found.

Quando falamos em correção monetária e juros, é porque estamos lidando com o fantasma da inflação. Sem inflação, não precisaríamos corrigir monetariamente valores e nem aplicar taxas de juros extorsivas como as que ainda são praticadas no Brasil, principalmente quando comparadas a outros países nos quais a inflação possui um histórico de controle a longo prazo. É bem verdade que o Brasil possui distorções inimagináveis em outros países, como os juros praticados pelos operadores de cartões de crédito, que encontram aqui um oásis para impor taxas que seriam consideradas ilícitas em outros lugares.

Mas o que é inflação? Segundo o Banco Central do Brasil (BACEN), inflação é o aumento dos preços de bens e serviços e implica na diminuição do poder de compra da moeda. A inflação é medida por índices de preços e o Brasil possui vários índices de preços, destacando-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), como o mais utilizado no sistema de metas para a inflação.

Ainda segundo o BACEN, as causas para o aumento da inflação podem ser resumidas em (i) pressões de demanda (quando ocorre um aumento na procura de algum bem ou serviço), (ii) pressões de custos (quando ocorre um aumento no custo da fabricação de algum bem ou para a execução de algum serviço), (iii) inércia inflacionária (processo em que a inflação passada se reflete nos preços presentes, por exemplo, na indexação) ou (iv) expectativas de inflação (composta por muitas variáveis, como taxa de desemprego, política monetária, credibilidade etc.).

Iniciado em 1993, o Plano Real foi um processo de estabilização econômica bem sucedido no Brasil após inúmeros fracassos como o Plano Bresser e o Plano Collor. Passamos a ter um controle da inflação que a maioria dos brasileiros vivos à época nunca tinha experimentado em toda a sua vida.

Com respeito aos contratos, o Plano Real trouxe uma consequência significativa. Ela ocorreu na aprovação da Lei 10.192, de 14 de fevereiro de 2001 que, em seu Artigo 20 e no respectivo parágrafo décimo, determinou o seguinte:

“Art. 2o – É admitida estipulação de correção monetária ou de reajuste por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos de prazo de duração igual ou superior a um ano.

§ 1o – É nula de pleno direito qualquer estipulação de reajuste ou correção monetária de periodicidade inferior a um ano.”

Desde então, foi vedado aos contratos possuir cláusula que permitisse o seu reajuste, atribuindo um indexador que corrigisse monetariamente o seu valor, com periodicidade inferior a um ano.

Eis que, finalmente, em 28 de junho de 2024, foi sancionada a Lei 14.905, que alterou o Código Civil para trazer novas diretrizes acerca de correção monetária e juros. Basicamente, foram introduzidas as seguintes alterações no referido código:

ARTIGO

NOVA DIRETRIZ

Artigo 389

Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado.

Artigo 395

Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários e honorários de advogado.

Artigo 404

As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária, juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Artigo 406

Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal.

§ 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código.

§ 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil.

§ 3º Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência.

Artigo 418

Na hipótese de inexecução do contrato, se esta se der:

I – por parte de quem deu as arras, poderá a outra parte ter o contrato por desfeito, retendo-as;

II – por parte de quem recebeu as arras, poderá quem as deu haver o contrato por desfeito e exigir a sua devolução mais o equivalente, com atualização monetária, juros e honorários de advogado.

Artigo 591

Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros.

Parágrafo único. Se a taxa de juros não for pactuada, aplica-se a taxa legal prevista no art. 406 deste Código.

Artigo 772

A mora do segurador em pagar o sinistro obriga à atualização monetária da indenização devida, sem prejuízo dos juros moratórios.

Artigo 1.336, § 1º

§ 1º O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito à correção monetária e aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, aos juros estabelecidos no art. 406 deste Código, bem como à multa de até 2% (dois por cento) sobre o débito.

É importante salientar que a questão dos juros em contratos já era normatizada no arcabouço legal vigente no Brasil muito antes do Plano Real. Isso ocorria mediante o Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933, que dispunha sobre os juros nos contratos, não permitindo a cobrança de juros acima do dobro da taxa legal. Por outro lado, essa nova lei também alterou tal disposição, já que excluiu do alcance do referido decreto as seguintes obrigações:

I – contratadas entre pessoas jurídicas;

II – representadas por títulos de crédito ou valores mobiliários;

III – contraídas perante:

a) instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil;

b) fundos ou clubes de investimento;

c) sociedades de arrendamento mercantil e empresas simples de crédito;

d) organizações da sociedade civil de interesse público de que trata a Lei nº 9.790, de 23 de março de 1999, que se dedicam à concessão de crédito;

IV – realizadas nos mercados financeiro, de capitais ou de valores mobiliários.

Por fim, o legislador estabeleceu uma vacatio legis (intervalo de tempo entre a data da publicação de uma lei e a data em que ela entra efetivamente em vigor) de 60 dias, sendo que somente após esse prazo, esta lei produzirá seus efeitos.

No items found.