Em junho deste ano, a Suprema Corte dos Estados Unidos, no caso Vidal v. Elster, 602 U.S. 286, decidiu que a marca"Trump too small" para camisas não poderia ser registrada. Isso porque existe um dispositivo na lei de marcas americana que proíbe o registro de marcas que usem o nome de uma pessoa sem o consentimento desta.
Em 2018, o advogado e ativista americano Steve Elster pediu o registro da marca "Trump too small", que pode ser traduzido como "Trump pequeno demais". A frase faz referência a um momento durante a corrida presidencial de 2016, quando o então candidato Marco Rubio fez uma brincadeira sobre o tamanho das mãos de Donald Trump, afirmando: "Vocês sabem o que dizem sobre homens com mãos pequenas". O slogan seria usado na confecção de camisetas como propaganda contra Donald Trump, então candidato à presidência dos EUA.
O USPTO - Escritório de Patentes e Marcas dos Estados Unidos rejeitou o pedido com base no Lanham Act, a lei de marcas americana, seção 1052(c), também conhecida como "Cláusula de Nomes", que proíbe o registro de uma marca que identifique um indivíduo vivo sem o consentimento deste1. No caso em tela, o USPTO entendeu que a marca fazia clara referência a Donald Trump e o titular não poderia obter o registro sem sua autorização.
Elster interpôs recurso contra o indeferimento, alegando que a "Cláusula de Nomes" violaria o direito à liberdade de expressão, garantido pela Primeira Emenda à Constituição dos EUA. No entanto, o USPTO manteve a decisão de não permitir o registro.
Inconformado com as decisões administrativas, Steve Elster levou o caso ao Judiciário. O Tribunal Recursal Federal reverteu a decisão administrativa, reconhecendo ter havido violação à liberdade de expressão2. Um recurso do USPTO levou o caso à Suprema Corte, que, por sua vez, reverteu a decisão do Tribunal Recursal Federal. A Suprema Corte concluiu que o dispositivo em questão não discrimina nenhum ponto de vista específico e está fundamentado em uma longa tradição do direito americano, que até então coexistiu pacificamente com a primeira emenda3. Dessa forma, a "Cláusula de Nomes" foi considerada constitucional, e, portanto, a marca "Trump too small" não poderia ser registrada sem o consentimento de Donald Trump.
No Brasil, de forma semelhante ao Lanham Act, a lei de propriedade industrial (lei 9.279/96) estabelece no art. 124, inciso XV, a proibição de registro de nomes como marca, salvo se com consentimento do titular.
Em outras palavras, para registrar uma marca que contenha o nome de uma pessoa, é necessário deter e apresentar autorização expressa do titular do direito. Dessa forma, o direito brasileiro, de maneira semelhante ao americano, busca conciliar o direito de registro de uma marca com o direito ao nome civil, que é considerado um direito da personalidade. Ambas as leis reconhecem que o uso de um nome como marca deve respeitar a integridade de seu titular, enquanto o equilibra com a proteção de marcas legítimas.
Além disso, de acordo com o Manual de Marcas do INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial4, mesmo que o nome que se busca registrar seja o do próprio titular do pedido, se coincidir com o nome de uma personalidade notória, será necessário obter o consentimento dessa última. Essa regra visa evitar que o nome de figuras públicas seja registrado como marca com o objetivo de obter benefícios da fama de terceiros sem autorização, situação que prejudicaria tanto o detentor do nome quanto os consumidores, que poderiam ser enganados quanto à origem dos produtos ou serviços.
No Brasil, temos um caso famoso envolvendo o art. 124, inciso XV. Em 2012, o medalhista olímpico Cesar Cielo pediu a nulidade da marca "CIELO", alegando que a empresa de pagamentos titular do registro não podia usar seu nome como marca e que tentava fazê-lo para aproveitar-se da fama do nadador, que estava no auge de sua carreira. Do outro lado, a empresa que se chamava Visanet, alegou haver adotado o nome em 2009, por causa de seu significado de "céu" nas línguas espanhola e italiana, e que a coincidência com o nome do atleta não havia sido proposital.
O caso foi submetido ao Judiciário5 que, em primeira instância, foi decidido pela juíza Márcia Maria Nunes de Barros a anulação da marca, determinando que a empresa se abstivesse de utilizar o nome "Cielo".
Inconformada, a titular recorreu, e a 1ª turma especializada daquele tribunal concluiu que o registro da marca seria válido. Dentre as razões, foi apontado que embora "Cielo" seja um patronímico notório, trata-se também de uma palavra dicionarizada com um significado específico em espanhol e italiano. Por ser um substantivo comum nesses idiomas, o registro poderia ser concedido sem a autorização do atleta, pois, no contexto da marca, não haveria associação direta ao patronímico, mas sim ao seu significado de "céu".
Embora o caso americano e o caso brasileiro tenham chegado a conclusões diferentes, ambos abordaram a necessidade de conciliar o direito ao nome com o direito de registro de marca composta por nomes civis, sendo permitido o registro desde que não sejam prejudicados os interesses de terceiros. Essa conciliação também ressalta a importância do registro de marca, por aqueles que se apresentam no mercado utilizando como marca, seu nome civil. Mas afinal, por que efetuar o registro de marcas nessas situações?
Utilizar o próprio nome como marca para identificar produtos ou serviços reforça o compromisso do titular com a qualidade e a reputação de seu trabalho, uma vez que sua identidade pessoal passa a estar diretamente associada ao que é oferecido ao mercado. Essa associação fortalece a confiança dos consumidores e destaca a responsabilidade do titular em manter o alto padrão que seu nome representa. Essa prática é especialmente comum e recomendada para titulares cujo nome possui ou pode vir a adquirir elevado valor de mercado, tais como artistas, estilistas, atletas, influenciadores e empresários.
Ao registrar sua marca, o titular assegura exclusividade no uso do nome em todo o território nacional para os produtos ou serviços especificados, além de poder impedir que terceiros não autorizados utilizem seu nome de forma indevida, buscando tirar proveito de sua boa reputação e, eventualmente, confundir os consumidores. Além disso, uma marca registrada pode se tornar um ativo de grande valor à medida que conquista o reconhecimento e a confiança do público, podendo, inclusive, ser licenciada, vendida ou utilizada como garantia em operações financeiras, gerando receita ao seu titular.
No entanto, alguns cuidados especiais são necessários durante o procedimento. O titular do nome deve fornecer uma autorização por escrito específica para o registro da marca, caso o pedido não seja feito em seu próprio nome. É importante destacar que, para marcas que contenham nomes, também se aplica a regra do first-to-file (primeiro a depositar). Isso significa que, se alguém solicitar o registro de um nome como marca para determinados produtos ou serviços, outras pessoas com o mesmo nome poderão ser impedidas de obter o registro para os mesmos produtos ou serviços com base na existência da marca anterior.
O registro como marca protege o nome contra usos indevidos e contribui para a consolidação da identidade e credibilidade do titular no mercado. É um investimento importante para garantir a proteção e o crescimento do negócio.
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